Meninos ou Adultos?


"Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar, para atravessar o rio da vida. Ninguém, exceto tu, só tu. Existem, por certo, atalhos sem números, e pontes, e semideuses que se oferecerão para levar-te além do rio; mas isso te custaria a tua própria pessoa; tu te hipotecarias e te perderias. Existe no mundo um único caminho por onde só tu podes passar. Onde leva? Não perguntes, segue-o!" ~ Friedrich Wilhelm Nietzsche, in 'Assim falou Zaratustra'.

Faço das palavras dele uma síntese sobre a relação existente hoje na estrada da vida, mas sobretudo o que sucede dentro do institucionalismo religioso.

Os "sacerdotes" não se dizem mediadores do homem com Deus, mas psicologicamente suas almas estão inundadas, impregnadas e sedentas de "mediação; mediunidade e tal poder".

Acredito que Nietzsche apenas parafraseou Paulo em Coríntios sobre a diferença entre meninos e homens.

Há adultos que vivem até hoje - mesmo depois de muitas velinhas apagadas - como crianças, mas não no sentido terno, dócil e meigo de uma criança, e sim na eterna dependência de ter um guia ora adulando, ora dizendo como tal "adulto" deve agir, aonde ir, o que dizer...

É aquela carência de provisão que gera uma "certa" segurança e supri outras tantas necessidades.

É perceptível como ainda há um número grande de homens e mulheres que mesmo depois de casados (as), com filhos (as) ainda carecem dos dizeres de seus pais.

Não falo da relação afetiva, dos bons conselhos, orientações e recomendações que um pai ou uma mãe possam dar, mas me refiro aquela abertura que muitos acabam dando aos pais de se intrometerem e decidirem sobre a vida do casal, o modo como devem tratar os filhos, os lugares que possam frequentar, as amizades a serem estabelecidas, e por aí vai...

Até mesmo Pedro um dos discípulos e apóstolos que conviveu com Jesus assim o fez por algum tempo.

Mesmo adulto, passado dos 30 ou 40 anos questionou a Jesus se seria aquele o tempo em que Jesus restauraria o reino. 

Mesmo adulto insistia em viver como criança.

Foi assim desde seu primeiro encontro com Jesus, continuou no dia a dia com o mestre, até às vésperas da crucificação, perdurou após a ressurreição, e se estendeu até mesmo depois da ascensão de Jesus aos céus, no seu (Pedro) convívio com os demais discípulos até o duro embate com Paulo.

Só então Pedro começou a abrir sua consciência, parafraseando Guimarães Rosa: "... só aos poucos é que o escuro é claro..." a ficha começou a cair para Pedro, e ele se deu conta que não dava mais para viver como menino.

E nós, como estamos vivendo?

Eternamente carentes de um sacerdote que não o Cristo ressurreto?

Vivemos como homens e/ou mulheres que cresceram e amadureceram ou ao menos estamos amadurecendo?

Ou precisamos/carecemos (dependência) de alguém para nos adular e dizer o que devemos fazer, aonde ir e o que falarmos?

Ainda somos meninos (as) ou adultos?

Não seja refém da vontade e do desejo alheio.

Não frustres os seus sonhos por causa da frustração de outros que deixaram de viver o que outrora acreditaram, para viver as expectativas lançadas destes tais.

Como disse o sábio Eurípedes: "Abundância é apenas um nome, nada mais; ao sensato basta o necessário".

Como bem resumiu Gandhi: "Acreditar em algo e não o viver é desonesto", e neste caso somos desonestos com nós mesmos.

Não é deixar de ter comunhão, não é deixar de ter companhia (partilhar o pão), não é deixar de crescermos juntos, mas é aprender a sermos como Jesus deseja que sejamos. É termos raízes e asas. Dependentes exclusivamente dEle!

A ironia salutar de um homem (que insistia em não perceber isso que devia deixar de ser menino) que vivia como menino é a sua declaração (aparentemente ingênua como uma criança, mas firme como uma convicção de adulto que aprendeu a caminhar com suas próprias pernas): "Para onde iremos nós, se só Tu tens as palavras de vida eterna?"

João Vicente Ferreira Neto

Comentários

Wanderlan disse…
Essa relação dos fieis com seus líderes religioso ainda tem muito o que evoluir. No cristianismo, pela ótica dos próprios valores cristãos, nós estamos muito atrasados. Eu mesmo já sofri muito com isso e já fiz minhas besteiras. Aprendi. Mas ainda temos muito o que evoluir. Essa discussão, q vc soube muito bem como começar é muito boa, João Neto.